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Prefeita de Anamã é alvo de críticas por contrato de R$ 2,9 milhões sem licitação

Prefeita de Anamã é alvo de críticas por contrato de R$ 2,9 milhões sem licitação

Lucas Costa
Por Lucas Costa | 30 de junho de 2025

No dia 30 de maio de 2025, o município de Anamã (a 162 km de Manaus) firmou um contrato emergencial no valor de R$ 2.962.375,50 (dois milhões, novecentos e sessenta e dois mil, trezentos e setenta e cinco reais e cinquenta centavos) com a empresa Delta Comércio de Produtos Alimentícios, Serviços e Construções EIRELI – ME.

O acordo foi formalizado por meio do Termo de Contrato nº 064/2025, com vigência até 19 de agosto do mesmo ano, tendo como objetivo a aquisição de cestas básicas para enfrentar os impactos da cheia na região.

A contratação foi feita por dispensa de licitação, o que tem gerado questionamentos sobre a transparência dos gastos públicos, em meio a uma série de denúncias que atingem diretamente a prefeita do município.

A responsável pela assinatura do contrato é a prefeita Kátia Maria Dantas Ribeiro (MDB), que tem enfrentado fortes críticas da população e de órgãos de controle. Ela foi denunciada ao Tribunal de Contas do Estado do Amazonas (TCE-AM) e ao Ministério Público do Estado por supostas irregularidades em contratos emergenciais, além de crime ambiental.

Entre os casos denunciados está o uso de máquinas da Prefeitura para descarte irregular de lixo em áreas alagadas, o que teria causado contaminação dos rios e prejuízos para comunidades ribeirinhas e pescadores.

Além disso, a gestão municipal é acusada de ter contratado serviços jurídicos no valor de R$ 239 mil e adquirido água mineral por R$ 190 mil — ambos também por meio de dispensa de licitação. A prefeita também é investigada por indícios de nepotismo e favorecimento em contratações públicas.

Os valores considerados elevados, somados à ausência de concorrência em várias contratações, aumentam a pressão popular para que o Legislativo municipal tome providências, inclusive com a possibilidade de instauração de um processo de cassação do mandato.

Interior isolado, gastos elevados

As suspeitas se tornam ainda mais relevantes quando se analisa o contexto geográfico e socioeconômico de Anamã. Localizado a cerca de 165 quilômetros de Manaus, o município é de difícil acesso, sendo totalmente dependente do transporte fluvial. Com uma população estimada em 14 mil habitantes, segundo dados do IBGE, e uma área territorial de 2.454 km², Anamã apresenta baixa densidade demográfica — cerca de 5 habitantes por km². O centro urbano é pequeno e precário, refletindo limitações históricas de infraestrutura e acesso a serviços básicos.

Em contraste, a capital amazonense, Manaus, concentra mais de 2,1 milhões de habitantes em uma área de 11.401 km², com forte presença industrial, maior controle institucional e melhor estrutura para lidar com emergências. A densidade demográfica de Manaus é de aproximadamente 191 habitantes por km², o que demonstra uma urbanização muito mais avançada.

Além disso, a cidade conta com acesso rodoviário, aéreo e portuário, enquanto Anamã permanece dependente de balsas e pequenas embarcações para qualquer tipo de transporte — inclusive de alimentos e insumos contratados pelo poder público.

Esse abismo logístico e populacional entre a capital e o interior evidencia o quanto o investimento de quase R$ 3 milhões em cestas básicas, feito sem licitação, levanta dúvidas sobre proporcionalidade, planejamento e fiscalização. A pergunta que se impõe é: como um município pequeno e isolado pode justificar gastos dessa magnitude sem transparência nem controle efetivo?

Fiscalização e próximos passos

Com os fatos já nas mãos do TCE-AM e do Ministério Público, a sociedade aguarda pelos desdobramentos das investigações. Organizações civis têm cobrado auditoria minuciosa dos contratos emergenciais, além de transparência ativa por parte da gestão municipal. Caso irregularidades sejam comprovadas, a prefeita poderá enfrentar sanções administrativas, cíveis e criminais.

Enquanto isso, o cenário em Anamã segue como retrato de um problema estrutural: o uso indiscriminado de contratos emergenciais em cidades do interior da Amazônia, muitas vezes com pouca fiscalização, mas com milhões em jogo.